domingo, 17 de janeiro de 2010

Cidadão do Mundo

Esse não é nem uma lista nem um apunhado de dicas, mas esse artista merece todo nosso reconhecimento (totalmente "underrated" no Brasil).

Num apartamento em Curitiba, um simpático senhor de 74 anos abre as portas para a nossa reportagem com um animado: “Bom dia. Tudo bem?”. Os cabelos grisalhos e a voz pausada não mentem: Waltel Branco já um mestre nesta arte chamada vida. O músico, que é nascido em Paranaguá e cidadão benemérito da capital paranaense, tem tantas histórias para contar que tentar transcrevê-las em uma única reportagem seria por demais pretensioso. Os inúmeros troféus em cima da estante da sala nos dão a certeza de que realmente estamos diante de um dos arranjadores dos filmes “Pantera Cor-de-Rosa” (esse mesmo que você está pensado) e “Filhos de Pablo”.
A vocação de Waltel para a música vem de berço. Seu pai, Ismael Helmuth Scholtz Branco, era maestro e tocava saxofone e clarinete. Mesmo sendo parnanguara, Waltel nunca fixou raízes na cidade litorânea. “Nasci às 18 horas e às 20 horas já estava em Curitiba”, afirma. “Só fui conhecer Paranaguá pouco tempo atrás”, diz.
Aos 20 anos, Waltel foi para os Estados Unidos tocar jazz. Acabou virando professor clássico em Illinois. Pouco tempo depois, Waltel mudou-se para Cuba. Lá se apresentou com músicos renomados como Lia Farrel, Perez Prado, Mongo Santamaria e Chico O´Farrow. Em 1962, quando Fidel Castro assumiu o poder na ilha, Waltel migrou para Nova Iorque, onde tocou por dois anos com Dizzy Gillespie.
Quando voltou ao Brasil, Waltel adotou o Rio de Janeiro como nova casa. Lá morou com João Gilberto, num apartamento em Copabana. O primeiro disco do chamado pai da Bossa Nova, Chega de Saudade, foi todo arranjado pelo paranaense. “O João Gilberto é gente fina. Só é meio pancada”, brinca. Nesta mesma época, ele também compôs dois choros com Pixinguinha.
Reiniciando sua peregrinação pelo mundo, Waltel foi parar na Espanha. Lá, teve a oportunidade de ser músico do Rei Juan Carlos de Bourbon e de estudar com Andrés Segovia, o maior violonista clássico do mundo. Hoje Waltel ainda é, sempre que requisitado, o substituto do guitarrista flamenco Paco de Lúcia em apresentações pela Europa.

Waltel e a Rede Globo

Em 1963, Waltel conheceu Roberto Marinho nos Estados Unidos. Neste mesmo ano, recebeu um convite para trabalhar em O Globo. Quando a TV Globo foi fundada, Waltel foi transferido para lá. Logo assumiu a coordenação do departamento musical da emissora. Compôs, entre tantas outras, as trilhas do Telecurso 2º Grau, das novelas O Bem Amado e Roque Santeiro e dos seriados Morte e Vida Severina e Os Trapalhões. Nos anos em que esteve na emissora, ajudou a lançar nomes expressivos como Elis Regina, Wando, Rosa Passos, Flora Purim, Kid Abelha e Belchior.
Em 1991, Waltel se mudou para São Paulo, onde atuou como professor da Universidade Livre de Música. Há pouco tempo, Waltel descobriu que uma caixa com 15 CDs de músicas suas foi lançada no Japão.
A importância histórica de Waltel para a música mundial foi devidamente reconhecida pela Enciclopédia Delta Larousse, lançada em 1972. O músico tem seu nome registrado no terceiro livro da coleção.


O Sr. nasceu em Paranaguá, mas não ficou nem 24 horas lá. Por quê?

Minha mãe estava visitando Paranaguá com meu pai quando eu nasci, prematuro de sete meses. Nasci num bairro chamado Campo Grande. Hoje é o local onde fica a Igreja. Mas na época era só um campo cheio de vacas. Como era prematuro e lá não tinha médico pra me tratar, meus pais me trouxeram correndo para Curitiba.

O Sr. começou tocando bateria, mas logo se interessou pelo violão. Por quê?

O violão é o instrumento que eu mais gosto. É o instrumento que mais se adapta a mim.

Como foi sua ida para os Estados Unidos em 1962?

Naquele ano, eu trabalhava com Perez Prado em Cuba. Quando o Fidel tomou conta, ele, que não era comunista, disse: “Vamos todos para Nova Iorque que nós não temos nada a ver com esse regime aqui”. Fomos para Nova Iorque e lá ficamos por um tempo.

O Sr. conviveu bastante com o Cazuza, não?

Sim. O Cazuza morou comigo no Rio. Ele era mais filho da minha mulher do que da mãe dele. Fiz vários arranjos para ele. Mudei muita música dele. A Faz Parte do Meu Show ele gravou primeiro como rock. Daí, eu peguei a letra e disse: “Vamos fazer samba disso aqui”. E deu certo.

O Sr. já viajou bastante. Qual é a sua cidade preferida?

Roma. Parece a Bahia. Só o povo que é diferente. As pessoas são mais cultas e educadas.

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